quarta-feira, 30 de setembro de 2015

Amor verdadeiro

Há quem diga que quando a gente aprende a se amar, o amor verdadeiro, de outra pessoa, vem também. Finalmente aquela maravilha idealizada vai chegar no momento certo, na hora certa. Mas isso não é necessariamente verdade.

Primeiro porque não acho que amor é algo que aprendemos, mas algo que permitimos, seja em relação ao outro ou a nós mesmos, seja consciente ou inconscientemente. Segundo porque acredito que quando você descobre o que o faz ser você mesmo e deixa-se amar cada pedacinho de suas imperfeições e de suas qualidades (se não todas, uma boa parte), na realidade você se depara com um monte de gente perdida ou nada a ver com você, que antes eram potenciais amores ou amigos.

Não que essas pessoas não existissem antes ou que tenham mudado da noite para o dia, elas estavam lá, mas estávamos tão entretidos com nossas inseguranças, que não olhamos para elas de verdade e achamos que elas poderiam ter algo a ver com a gente, que iriam trazer algo bom pras nossas vidas, mas não.

Pessoas novas também se aproximam e, por incrível que pareça, pela primeira vez nos damos o direito de dizer não e de afastar energias que não queremos por perto, não porque amor é orgulho, mas porque é cuidado e atenção. Porque qualquer coisa não serve mais. Porque conformar-se e adequar-se não é mais prioridade. Mas, sim, ser e receber intensamente, deixar o coração falar e duvidar do que não aquece o peito.

Além disso, não é porque você se ama e se respeita que o amor da sua vida vai bater à sua porta. Você só vai saber com um pouco mais de clareza quais portas fechar e em quais pode bater.

Amar-se talvez também seja entender que ninguém é perfeito, começando pela gente. Idealizar alguém é um veneno, seja o outro ou o ser refletido no espelho. Quem sabe não estaremos prontos para amarmos e sermos amados por inteiro ao acolhermos a nós mesmos, integralmente... Com cabelo em pé, cara de sono e falta de disposição ou vontade.

Amar-se talvez seja permitir que todo amor seja verdadeiro, pois ele já tem morada lá dentro e não se importa mais com o que não mora no peito.

sábado, 26 de setembro de 2015

Família

Pelas famílias que deixam de existir quando acaba o amor...
Quando se quebram, ou se perdem, até se esquecem...

Pelas famílias que são forjadas por pais que recebem crianças indesejadas e que as negligenciarão, as forçarão a trabalhar e não irão garantir sua segurança, seu desenvolvimento como seres humanos, sua formação como cidadãos...

Pelas crianças que não conhecerão o amor incondicional de alguém que as quer perto, que não terão sua comida preferida feita no dia de seu aniversário e que não levarão uma bronca daquelas que constroem caráter.

Pelas crianças que vão passar frio e fome e que terão que ser fortes quando a sociedade as ignorar todos os dias.

Pelas crianças que serão abusadas por pessoas com o mesmo sangue.
Pelas crianças que serão abusadas por pessoas com sangue diferente, mas função parental ou função nenhuma.

Pelas crianças que não terão o direito de serem crianças. De serem amadas e acolhidas.

Pelas crianças que deixarão de ter e ser família porque alguém decidiu que o amor deve ser formatado. Que o amor tem que se enquadrar em rótulos.

E quando o poder é das pessoas que têm medo de conhecer todas as formas de amar, acontecem absurdos. Elas não deveriam poder decidir por aqueles que são os mais puros, cheios de amor e livres de preconceitos.

Cada criança tem sua individualidade, seu jeito, seus traços. Se todos somos diferentes por que as famílias, união do que cada indivíduo envolvido tem de melhor, deveriam seguir um padrão?

Ao invés de dinheiro no farol, deveríamos poder dar luz para o coração das nossas crianças.
Amor e luz.
Mas agora é proibido amar, já já será proibido ser feliz, pois não somos livres há tempos.

quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Passe

Passe do limite.
Passe o tempo que quiser tirando fotos de si mesmo, da árvore, do poste, de um estranho na rua.
Passe do ponto, passe da hora, passe pra outra.

Passe perfume antes de ir para a cama sozinho.
Passe o maior tempo possível se amando. É bom.
Passe pra trás a ideia de que se achar é ruim. Se ache, se perca, se tenha. Se seja.

Passe alguns minutos lembrando porquê o seu ouvido não é penico, porquê sua vida não é penico, muito menos seu coração. Despenique-se.

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Sobre saudade

Às vezes eu acho que saudade é um sinal do amor. Em outras, acho que é um sinal comum.

No comecinho do amor, aquela pontada de saudade inesperada mostra que devemos prestar atenção no que está acontecendo em nosso coração. Algo novo se aproxima, mesmo que seja de alguém já conhecido, e estamos preparando um espaço dentro da gente para acolhê-lo. Ao mesmo tempo, essa pontada pode ser só uma lembrança de alguém, disfarçada de falta.

Durante o amor é possível sentir saudade de alguém que está ao nosso lado. Pode ser porque a gente antecipa os momentos distantes e até acha que pra tudo aquilo que tem dentro do peito, não haveria vidas suficientes para chegar até o final. Por outro lado, essa sensação pode ser fruto de uma quebra na rotina que vem como aviso, da mesma forma que a gente sente falta (e vontade) quando lembra que no dia anterior não comeu arroz e feijão.

Na despedida do amor, a pontada de saudade é acompanhada de um tipo de dor que só o amor apresenta, que vai mudando e diminuindo até acabar. Mas também pode ser só uma quebra de costume e hábito com que, como em toda dieta, a gente se acostuma.

É difícil desligar o sentir falta do amar, mas a saudade tem vida própria. Se ainda posso e quero ansiar alguma coisa, acho que desejaria algo do amor, mesmo quando confundido com outras coisas.

O que eu ainda espero do amor é que passe, que chegue e que cure. A saudade vem depois.

quarta-feira, 16 de setembro de 2015

Fuga

O seu rosto. No meio de uma multidão, encontrei alguém com o seu rosto. Assustei-me com a obviedade desse meu ato falho de querer te ver e ter perto. De te buscar em alguém que não conheço e parar no meio do caminho pra lembrar de como você é. Do que me encantou e que agora desencanta.

A sua voz. Entre tantas outras vozes falantes, uma igual à sua me puxa pela orelha pra perto do seu peito. Da nossa memória. Não acho que tenhamos tido algo nosso, mas tenho certeza de que lembramos de estar juntos da mesma maneira. Não com a mesma intensidade, mas com o mesmo brilho.

Seu trajeto. As linhas ainda marcadas no meu corpo, dos deslizamentos da sua intenção, fizeram-me tomar uma decisão. Meu corpo está fechado para turistas. Não porque não haja descobrimento e ganhos na exploração temporária do outro, mas porque a energia contemplada nesse exercício, para mim, é muito cara.

Das fugas todas que fazemos, das intenções que disfarçamos e das desculpas que damos, a mais incompreensível para mim é a tentativa de escape do amor. Então, enquanto você foge, eu sigo, tentando disfarçar que, na verdade, o que você sentia era pouco. E que esse pouco não foi suficiente para transformar passeio em jornada. Nem seria suficiente para suprir, em mim, os horizontes que habito.

Então, enquanto novos caminhos se abrem, a despedida se encerra. Em frente, sempre em frente, para fugas diferentes.

segunda-feira, 14 de setembro de 2015

O beijo

Fiquei pensando naquele beijo que deixamos de dar. Naquele fim de semana que, com medo, deixei de lado te acompanhar. Em todas as coisas que aconteceram desde então. Nem sei por onde começar.
Eu amei outras pessoas, você também. Quebrei o meu coração, você também. Feri alguém profundamente e acho que você também.

Tive medo, fiquei doente, dei ótimas gargalhadas e passos tão corajosos que eu ainda não tive tempo de perceber o quão arriscados foram. Você aí, do outro lado, que reacendeu a dúvida com um gesto singelo, deve ter algumas histórias fascinantes pra contar e muitas outras para ouvir. Cada um de nós com um lado da história, com uma impressão da vida, com outro ponto para a mesma vista.

Mas, sabe, hoje eu sei que naquela época ainda não estava pronta. Sinto que você me observa e que tenta ler meus pensamentos e só por isso já ganha um pedaço da minha intenção. E aqui, em mim, a intenção é o que prepara o terreno pro amor, que permite ao coração apaixonar-se.

Não sei, às vezes eu tenho a sensação de que a nossa história é um roteiro de cinema enterrado na gaveta de algum grande cineasta, esperando ser achado para ser gravado como um projeto paralelo. Sabemos que, muitas vezes, projetos paralelos viram o centro de nossas vidas e você teria um potencial enorme de se tornar o antagonista do meu passado, revolucionando, com um só beijo, a história de dois lados se tornando um só.

quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Não é você, sou eu

Das coisas que tenho feito errado e das escolhas que me mostram suas consequências todos os dias, a que me tem sido mais cara é a de ter te deixado ir. Com o passar dos anos, tenho percebido o quanto teria sido feliz se tivesse aceitado o seu amor.
Muitos me diriam: mas como você sabe que teria sido feliz? E eu responderia: aquela era a pessoa que mais gratuita e genuinamente me amou. Bem antes de confessar sua paixão, eu já sabia. Via nos seus olhos, no jeito que se contorcia quando estávamos juntos e em outros sinais que eu não levava a sério, mas sabia o que significavam.

Às vezes pela vida, achamos que vamos encontrar pessoas que correspondam ao nosso ideal estético ou à nossa prospecção financeira, mas a verdade é que nunca sabemos o que essas pessoas vão se tornar.
E por mais que você não fosse o modelo integral do que queria ou do que estava acostumado, o que me oferecia era real. Falava na minha cara o que pensava, o que queria e até confessava suas dúvidas e agonias. Dizia que era natural e que nem sabia o porquê de se abrir comigo, mas eu sabia.

Exercia meu poder para te ter por perto e não te perder, mas a verdade é que você era algo que eu nem queria. No fundo eu sabia que ali poderiam acabar muitos vazios, mas na minha maneira de existir eu preferia estar só e ter melancolia pro jantar. Eu sou assim mesmo, pura contradição e carência que não está pronta para cura.
Se a gente se permite ser amado e assume que a procura por um par acabou, acabamos tendo que lidar com nós mesmos e acho que, pra isso, é preciso muita coragem.

No fim, prefiro acreditar que você não era pra mim, se não teria feito dar certo. Nem sei porque precisei dar tantas desculpas ou justificar meus erros, afinal não era pra ser.
A gente se coloca em cada situação na vida que só nos resta colocar culpa no que está fora da gente para não termos que encarar o quanto somos responsáveis pelo que nos faz mal.

E não é que a história do "não é você, sou eu", pode ser verdade?