quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Mar(é)

Um looping interno e eterno. Parece que é assim que estamos agora, eu e meus outros eus, que eu nem imagino quem sejam, mas que se mostram mais do que eu gostaria e contradizem o que eu digo sobre mim.

Sentimento de ser um siri em sua toca. Sabe, aqueles que ficam na praia, no subir e descer das marés, com um furinho sobre sua casa, mantendo-se vivo para poder sobreviver? Ou seria o contrário?
Parece pleonasmo, mas, sob o vem e vai das ondas, ele fica imerso, esperando as lágrimas da terra irem embora, para que possa se arriscar, sem respirar, a ir atrás do que o deixa sobreviver: alimento.
Algo capaz de nutri-lo para que possa, com calma, respirar novamente em sua toca.

Engraçada essa diferença entre viver e sobreviver. O siri parece vivenciar suas mais intensas experiências (que devem existir de uma maneira bem crustácea) dentro de sua toca. Abaixo de nossos pés, enquanto caminhamos na praia, vivenciando as nossas.
Inevitavelmente vem o momento em que ele precisa sair dessa existencialidade poética e marítima e partir para uma caçada substancial, atrás do alimento que o faz sobreviver.

Gostaria de estar mais para o siri, que aguarda a hora de sobreviver, do que para o humano que sobrevive esperando a hora de viver. Sobrevivência, no segundo caso, que não é substancial, mas existencial.
Parece que sigo sobrevivendo do que basta, esperando o grande momento de viver.

Talvez os que vivem uma sobrevida, tenham mais acesso à vida do que imaginemos.
Uma vida que acontece e depois culmina na sobrevivência, não o contrário. Uma vida em que puramente se existe e reflete e explora ao máximo a estupidez humana, observando-a, como homens invisíveis, os tais mosquitinhos que sempre dizemos querer ser.

E pensar que um siri pode saber mais do que é a vida, em seu sentido mais puro, do que qualquer outro dominante.
Não sei, parece que estou tempo demais embaixo d'água esperando a maré passar.

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Ponto e vírgula;

(… E parecia que aquele parêntese nunca ia se fechar.

Eram reticências e mais reticências ocupando o espaço de uma vida.

Às vezes surgiam também os pontos de interrogação, que davam um mareado na mesmice de continuar sempre em linha... Em linha com outro, em linha com Deus, em linha com as metas, mas será que em linha com si mesmo?

Já posso ver que a resposta está na pergunta: a alma não segue linhas.
Não segue sequer uma pontuação, onde tudo o que achamos definido com ponto final, ressurgia depois de um travessão. As vírgulas se enganavam também, misturando todos os sentidos enquanto se escrevia a vida.

Mas afinal, quando vamos fechar o parêntese?
E quando fechado, o que será que vai ser de todas as nossas explicações e dogmas, crenças e teorias, que fazemos questão de deixar implícitas?

Já teremos explicado tudo?
Será que somos poucas palavras ou só um ponto (vírgula, espaço, travessão) em um período extenso?

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segunda-feira, 8 de outubro de 2012

(Des)encontrando

Há tantas escolhas que nos separam de pessoas, de caminhos, de ideais...
Tantos nós que se desfazem em "eus" e "vocês"...
O resto (que fica) é coincidência ou lição do destino.

Há também os encontros da vida,
os começos e os recomeços de todos os mundos.
Atos que dissolvem qualquer dor e reverberam qualquer alegria.

Encontros programados por algo além de nosso entendimento,
desencontros que acontecem fora de nosso alcance.

As despedidas, parte vital dos encontros, são o que mais constrói nessas indas e vindas.
Aquelas que fazemos e, principalmente, as que deixamos de fazer.

São esses tais encontros que fazem nossa história, o que aconteceu no final deles, então, não importa tanto assim. O tempo limpa tudo e nunca seremos o que dissermos, só o que nos permitirmos.

Entrevidas, entremeios, entrefins, seguimos assim, incompletos e infinitos, sempre nos (des)encontrando.

(Des)encontros esses que são uma valsa indecifrável para mais de dois, em que o intangível dança com o que conduzimos dentro de nós.

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

A(deus)

(à Salvador José Troise, in memoriam)

Sabe quando você fica sem palavras?
Sabe aquele momento em que tudo fica parado, mesmo em movimento?
É estranho, eu sei, mas com certeza você já esteve nesse mesmo lugar sem encontrar ninguém nem nada que pudesse explicar esse momento.

Assim me sinto, mas nem imagino como ou se deveria explicar tudo isso.
No lugar onde estou encontro uma galeria de momentos de amor e percebo que não há despedida.
Mesmo que não haja Deus ou vida após a vida, as energias boas de pessoas excepcionais nos acompanham.
As lições, o aprendizado, o cheiro de tabaco no cachimbo e o apelido não podem ir embora assim, não vão embora de nenhuma forma.

Sei que não merece lágrimas, mas é um jeito do meu corpo expressar que estou entendendo o que está acontecendo, com a certeza de que de alguma forma a sua obra boa, seu carinho de pai e avô, permanecerão.

Enquanto isso, lembro demoradamente de cada coisa, objeto, paisagem e aprendizado que pude viver ao seu lado.

Alguns dizem que sou boa com as palavras, mas essa é a única forma que eu encontro de homenagear sua memória, na verdade, a minha memória de você.

A(deus).