quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Manifesto do nada

Hoje escrevo pelo nada.

Pelas pessoas que nada fazem quando algo deve ser feito.
Pelas pessoas que agem errado por não terem posição, por serem nada.

Por gente que se corrompe por nada.
Mas se é corruptível, é porque não vale nada mesmo.

Por aqueles momentos em que nada pode ser feito
e por aquelas palavras de efeito que não afetam.

Que o nada fique em seu lugar, pois aqui só tem espaço para quem é.
Seja assumidamente tudo o que quiser, mas não seja "nada".

Mas aí eu penso: o que sobre para o nada a não ser ele mesmo?
Você que nada é, nada fala, nada vê, bem-vindo ao eterno vazio que vazou de dentro de você e que vai se eternizar ao seu lado.

quarta-feira, 23 de outubro de 2013

Sala de espera

- Não sinta ao meu lado - ela falou.
- Quer dizer "sente"?
- Tanto faz, não sente e não sinta aqui.

Interpretou o que ouviu com tanta surpresa que nem fala cabia na incompreensão do momento. Afinal, do que falava?

- (Falo) Do seu amor. Da sua fé, igual a minha, praticamente inexistente. Da sua fúria, como a minha, mal direcionada. Do seu jeito e do seu gesto, como os meus, manifestações do que não é manifesto. Já falei do amor? Porque é nele que as palavras não prestam e é nele que me perco...

Ia responder, mas não coube um sopro de vogal... Ela continuou:

- Nem me olhe. Não troque seu brilho com o meu, sai faísca. Não jogue seu verso contra o meu, risada certa. Nem silencie a sua voz perto de mim, que irei me sentir completa.

E enquanto ela se refazia de toda essa profecia e confissão, coube uma fala:

- Tudo isso por causa de um lugar?
- Sim e não. Pois o seu lugar em mim, não é lugar de manifestação. Nele não nasce árvore, nem cabe prédio, é lugar de outras construções. Não sente perto de mim que minha alma agarra a sua. Não suspire e não sinta, que não é a hora nem a chance de ser.

Começara a entender, mas achava tudo aquilo invenção. Como poderia caber tanta coisa em um assento no sofá da sala de espera? Parecia ter lido sua mente e, ao mesmo tempo, não havia sentido em nada daquilo. Ela continuou:

- Poderia até ser uma questão de lugar, mas está mais para tempo, para modo e para conjugação. O "eu e você sim" não cabe dentro do meu "não". Pelo menos não agora.

Sem entender, mas entendendo, estranhando, mas agindo com naturalidade, se afastou dela e de sua simplicidade. Apesar dos pedidos e dos mandos, sentiu e sentou, mesmo longe, fora (dela).

Percebeu, então, quem era. A que não havia sido pedida, perdida ou encontrada. Alma gêmea à sua, que sabia o que dizer, sabia o que ser, mas que iria desafiá-lo a assumi-la e a tê-la sem dúvidas, conhecendo todos os riscos.

E ainda tem gente que diz que ela vem se você cuidar do jardim, mas se você se distrair, pode negá-la sem ao menos ter permitido que fossem, um para o outro, o que tinha que ser, o que havia de ser e o que sempre foi: a própria felicidade.

segunda-feira, 21 de outubro de 2013

Imune

Olho ao redor e a falta de foco me acalma.
Não piso em palco, não quebro salto, não minto.

Parei de sentir e acabei escolhendo assim, quem diria.
O rei da imprecisão emocional e do descontrole oral, mais um papel.

Como corujas perdidas no horário de verão, que não enxergam, não revelam, não relevam.
Você e eu.

Deslocados;
Desbundados;
Desmundados;
Mas nunca desalmados. Aí que mora o perigo.

Me poupo do lado forte, mais uma safra de safras perdidas, mais uma morte singela e sofrida se aproxima.
E se a gente não amasse, não haveria dor que nos uniria.

E nada nos une.
Nada separa.
Imune?

segunda-feira, 14 de outubro de 2013

Eufobia

Não, nem o grito mais agudo poderia extravasar todo o sangue que parece estar correndo ao contrário no peito. Parece que nada é capaz de trazer de volta o ritmo das batidas e dos batuques do centro da vida.

Era medo. Medo de estar errado, de estar certo, de descobrir que não é o que queria, muito menos o que imaginava. Medo de se perder, mas, acima de tudo, medo de se achar e de se decepcionar.

Tememos o agora, o fim, o ser, o estar, o caminho, o outro e, principalmente (talvez antes de todos os medos), nós mesmos.

A era dessa eufobia transborda toda e qualquer boa vontade e é refletida em espelhos tortos, em que não conseguimos nos ver com clareza com os olhos dos outros, quem dirá com os nossos.

Não, nem o mais gelado dos olhares é capaz de paralisar o caminho torto que estamos seguindo.
Não conseguimos assumir nossas culpas e, ao jogá-las nos outros, nos sentimos mais culpados ainda.

A eufobia pesa, é presente e impera na nossa retrógrada pós-modernidade.

Mesmo que pudéssemos nos pegar no colo, o que haveria para ensinar?
Quem virá nos diagnosticar?

Não, não quero ser o último a chorar.
Tenho medo de encontrar o fio da minha alma, se ficar para trás.

Eufórico eufóbico. Parece nome de palhaço, mas é a (des)graça de estar vivo.

quinta-feira, 3 de outubro de 2013

( )

Ah me poupem das não bobagens.
Por favor, me poupem do medíocre, do que é dado como certo, da bagagem de mão.

Sequestrem-me da minha vida, que não é meu reflexo, é fruto de reflexão.
Tirem-me o ar que não acalma e o coração que aperta aos 23 não por amor, nem por adrenalina boa, mas pelo desconforto da rotina.

Poupem-me dos amanhãs e dos olhares que não atingem a alma.
Venham, salvem-me do "eu" que construí e dessa vida que não me permite sonhar sem ter vergonha, quem dirá viver.

Ei, venham logo!
Acordem todo mundo, porque vale a pena ir.
Tem alguém aí?

(                 )

Quebrou-se a casca do ovo.
(a)Frito.