E como pode coisa dessa? Menina que já tem idade impressa em documento agigantar de um dia para outro? "É doença...", disse a tia, "é loucura", disse a vó, "é contagioso", pensou consigo mesma. Mas antes fosse.
Já fazia algum tempo que sua pose encolhida não ornava com o abrilhantado olhar que semeava por corpos outros. Sentia um incômodo na ponta dos ossos, mas como quem agarra um sonho, não deixava que eles esticassem nem um pouquinho só. Seguia encolhida para parecer pequena, pois acreditava que a percepção dos outros estipulava seu tamanho e era inconcebível mudar isso. Já pensou o choque?
Um dia se viu presa frente a uma poça d'água e percebeu um outro eu distorcido no olho de quem olhava. E quem era aquele que olhava? Era ela. Era ela? Pensava, pensava, pensava. Refletia sobre como ela nunca tinha olhado para o próprio reflexo. Nunca tinha tentado se ver, só via o que os outros diziam ver, afinal a maioria sempre está certa, não é mesmo? Não. Começou a pensar e a se olhar e a acolher seus sentimentos, seus medos, seus erros, seus eus e de repente as pernas, os braços, os dedos, a cabeça e por que não os pés, assumiram outro tamanho. Maior, quase contundente. Assustada, procurou algum lugar em que sua imagem coubesse, pois aquela poça era pequena demais àquela altura.
Resolveu trocar a opinião deles por um espelho e não foi que deu certo? Conseguiu se ver e o espanto e medo que a dominavam foram trocados por um sorriso. O encolhimento foi exorcizado por um brilho que nunca tinha visto antes: o seu próprio. Sem desvios em lentes alheias.
Saiu andando com seus passos de gigante, deixando para trás a aparência que não lhe cabia mais. Pararam ela na rua mais vezes do que seus grandes dedos poderiam contar, sempre dizendo: "nossa menina, como você cresceu!" e ela respondia sorridente a cada pessoa que estranhava seu tamanho: "não cresci, não, só parei de me encolher".